A fuga para o Rio
Certo dia, pretextando novos concertos em São Paulo, Carlos Gomes veio para cá, mas, em seu ânimo, estava planejada uma fuga para mais amplos horizontes. Arranjou um burro e disse ao irmão, José Pedro, que ia para Santos, onde embarcaria para o Rio de Janeiro. José Pedro riu e disse-lhe que voltaria de Santos mesmo, pois não teria coragem de abandonar sua terra ntal.
- Qual! - respondeu o futuro maestro - Só voltarei coroado de glória ou só voltarão meus ossos!
E lá se foi ele, montado no burrinho, na sua penosa marcha pela Serra, até Santos, onde embarcou, no navio Piratininga, debaixo de fortes aclamações de estudantes e amigos, rumo à Côrte, levando consigo uma carta de recomendação, que lhe facilitaria o acesso ao Paço de São Cristóvão e ao bondoso coração de D. Pedro II.
Os primeiros dias, no Rio, foram de tristeza e saudade. Hospedou-se na casa do pai de um estudante de S. Paulo. Sentia remorsos por haver abandonado o velho pai. Um dia, porém, escreveu-lhe pedindo perdão e revelando-lhe seus planos. O velho Maneco Músico comoveu-se ante o tom sincero da carta e não só perdoou ao rapaz, mas lhe estabeleceu uma pensão mensal, dizendo-lhe: "Que Deus te abençoe e te conduza, próspero, avante, pelo caminho da Glória. Trabalha e sê feliz! Teu pai". Com isso, Carlos Gomes sentiu-se mais disposto a enfrentar o futuro.
Apresentado ao Imperador, por intermédio da Condessa Barral, o monarca, sempre amigo e protetor dos artistas, encaminhou-o a Francisco Manuel da Silva, diretor do Conservatório de Música e também animador dos jovens músicos.
Carlos Gomes teve como primeiro mestre, em contraponto, Joaquim Giannini, famoso musicista italiano, que viveu muito tempo no Brasil. No ano seguinte, em 1860, na festa de encerramento dos cursos, Carlos Gomes apresentou uma sua composição. Mas caiu doente, atacado de febre amarela, impossibilitado de comparecer. Sua ausência foi muito lamentada. Eis, porém, que surge o imprevisto: quando o maestro ia dar início à "cantata", o jovem campineiro surge no estrado, olhos brilhando de febre, e pede a batuta para dirigir sua peça. Nada o demovera de ir dirigir. O resultado foi emocionante. Aplausos e mais aplausos, a que Carlos Gomes não pode resistir e desmaiou, sendo levado para casa, sem sentidos. Isso tudo chegou ao conhecimento do soberano, que mandou levar-lhe uma medalha de ouro, como recompensa a seu esforço e talento. Começou, então, a marcha triunfal do moço campineiro.