"É belo triunfar assim aos 20 anos" (Francisco Manuel)
A vida artística do Brasil Império do século XIX, desenvolveu-se com mais intensidade e importância na côrte do Rio de Janeiro e em São Paulo, onde a ópera era apresentada com maior freqüência. Nos salões da aristocracia carioca e paulista dançava-se a polca e a valsa. Cantava-se a modinha e as canções estrangeiras, francesas e italianas de preferência.
A 11 de julho de 1836, na pequena Vila Real de São Carlos, atual Campinas, nasce Carlos Gomes, um maestro dotado de uma capacidade genial de invenção melódica, de alma exaltada e intensa, que teria o sucesso como resposta às suas inquietações musicais.
Ainda menino, Carlos Gomes, aprende a tocar vários instrumentos com o pai, mestre de música e de banda, conhecido em Campinas como Maneco Músico. Homem de resistência invejável e de hábitos severos que Carlos Gomes aprende a admirar e a respeitar.
Já rapaz, divide seu tempo entre costurar calças e paletós numa alfaiataria e aperfeiçoar seus estudos para compor músicas. É desta época o sonho de ser músico e compositor como os grandes maestros que já conhecia.
No início de sua carreira, ajuda na banda do pai, tocando junto com seu irmão, José Pedro Sant'Anna, nas igrejas e nas festas familiares para ganhar algum dinheiro. Aos 15 anos compõe valsas, polcas e quadrilhas. Aos 18 anos, faz sua primeira missa repleta de misticismo e a dedica ao pai, que então percebe o talento promissor de seu filho. Aos 20 anos, ensina piano e canto.
Em 17 de abril de 1859, então com 23 anos, faz sua primeira apresentação oficial ao público. Seu irmão e seu amigo Levy executam na clarineta sua fantasia Alta Noite, entre aplausos ensurdecedores. Universitários da Faculdade de Direito de São Paulo que assistem a récita, entusiasmados com a beleza de sua música, convidam os irmãos Gomes para se apresentarem em São Paulo. Esses são os primeiros passos do compositor que iria se tornar conhecido mundialmente.
Entre o sonho e a angústia
Em visitas freqüentes a São Paulo, na companhia de seu irmão, Carlos Gomes conhece o sucesso com o Hino Acadêmico e com a modinha Quem Sabe?, ambos sobre os versos do poeta e amigo Bittencourt Sampaio. A partir desta época, não é mais o Tonico dos íntimos, mas o músico Antonio Carlos Gomes, notado e admirado. Impressionado com o sucesso na capital, retorna a Campinas onde fica pouco tempo, pois não consegue reabituar-se à vida normal.
Foge para o Rio de Janeiro sem a permissão do pai que tanto admira. Aflito e com forte remorso escreve-lhe uma carta: "Uma idéia fixa me acompanha como o meu destino! Tenho culpa, porventura, por tal cousa, se foi vossemecê que me deu o gosto pela arte a que me dediquei e se seus esforços e sacrifícios fizeram-me ganhar ambição de glórias futuras? Não me culpe pelo passo que dei hoje, [...] Nada mais lhe posso dizer nesta ocasião, mas afirmo a vossemecê que as minhas intenções são puras e espero desassossegado a sua benção e o seu perdão."
Recebe a resposta, numa carta longa e severa, em que o pai reafirma a sua autoridade, concedendo o perdão e autorizando a remessa de 30 mil réis por mês. "Que Deus te abençoe, meu filho, e te conduza próspero avante pelo árduo caminho da glória que vais percorrer. Trabalha sem descanso, e, meu filho, sê feliz, muito feliz. Teu pai."
No Rio conhece a Condessa do Barral, grande admiradora de suas canções que o apresenta ao Imperador, D. Pedro II, de quem conquista respeito e proteção. Matricula-se por ordem imperial no conservatório de Francisco Manuel e, no fim do ano, executa sua cantata para o encerramento do curso. No ano seguinte, encena a sua primeira ópera, A Noite do Castelo, com grande sucesso. Dois anos mais tarde, também através da Imperial Academia de Música e Ópera Nacional, apresenta sua segunda ópera, Joana de Flandres, triunfando novamente. D. Pedro II entusiasmado com o jovem maestro manda-o para a Europa.
"Este jovem começa por onde eu termino." (frase atribuida a Verdi)
Na itália estuda no Conservatório de Milão, com o maestro Lauro Rossi e diploma-se como maestro compositor aos 30 anos. Após concluir seus estudos, ganha popularidade com as músicas de duas revistas de grande sucesso na Itália, Se sa minga e Nella Luna. Carlos Gomes consagra-se definitivamente com a representação grandiosa de Il Guarany no maior teatro lírico do mundo, o Alla Scala, o que lhe vale o reconhecimento do compositor italiano Giuseppe Verdi.
Após o sucesso de Il Guarany na Itália e no Brasil, casa-se com a pianista e professora italiana, Adelina de Conte Peri, com quem tem cinco filhos.
Mas Il Guarany, não lhe dá retorno financeiro: as 3 mil liras pagas pela Editora Lucca para ser dona de todos os seus direitos autorais, não são suficientes para atender às suas necessidades. É neste período que sua carreira ganha grande impulso compondo, na Itália mais três óperas: Fosca (1873), Salvador Rosa (1874), Maria Tudor (1879). Com a saúde abalada e angustiado pelas dificuldades financeiras , volta para o Brasil para a estréia de O Escravo (1889) e vai para São Paulo, quando chega a notícia da proclamação da República.
Por ser amigo pessoal do Imperador, seria considerado persona non grata e por isso, regressa a Milão, não vendo possibilidade de se adaptar ao novo regime.
A empresa Scala encomenda ao maestro uma nova ópera. Prepara O Condor em um intervalo de três meses, obra que não é compreendida nem pelo público e nem pela crítica. Em 1892, compõe Colombo, poema sinfônico retratando o descobrimento da América.
Já muito doente, é convidado pelo governador do Estado do Pará, Sr. Lauro Sodré, para ser diretor do Conservatório da cidade de Belém. Carlos Gomes regressa ao Brasil, toma posse no dia 5 de julho de 1895, onde trabalha por um ano vindo a falecer em 16 de setembro de 1896, aos 60 anos.